segunda-feira, 3 de junho de 2013

ESSE É O VALE

Poema Sem Título de Érico Max Müller


Pintura de Caspar Friedrich


Esse é o vale e esta é a mão que o desmancha
para que ainda maior seja a identidade
entre os guardiões e os guardados.
Por muito tempo te distanciaste,
vertebrado na crônica dos parentes,
e agora ressurges um nível das noites.

Onde os anciãos cultivam velas e palavras cansadas,
onde framboezas contaminam a frágil dança dos amantes,
onde o gato continua subterrâneo, à espreita
dos que se uniram sob a proibida imagem.
Talvez aqui, a lua manchada pelos feiticeiros,
deuses percorram jardins e clavicórdios.
O vale é como o poema ou a folha – apalpados,
transmitem-nos o imponderável tremor de seu ser.

Vale, célebre vale, tanto cresceste em minha origem,
alimentando-me de silêncio e certos momentos
evocando um passado não compartilhado.
Quantas vezes será preciso cantar-te, ó vale,
até que eu fique inteiramente submerso
em teu dorso?


(Extraído de Ao corpo circunscrito, Edições Livros da Ilha, Fpolis, 1966)

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