Por Jayro Schmidt
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Em culturas orientais, o ler proporciona o escrever.
Em culturas ocidentais, há controvérsias acerca disso.
Tomo como exemplo Schopenhauer ao dizer que ler é pensar
com a cabeça alheia. Desconta-se o fato de que ele estava indignado com os
eruditos que infestavam os meios acadêmicos.
Bem antes de Schopenhauer, e livre da pesada atmosfera
das academias, Sêneca poderia argumentar o oposto. Pensava que a leitura é imprescindível
para quem escreve. Por vários fatores.
Um deles é o terapêutico, o ler para descansar a mente
do esforço despendido. Mas as coisas ficam mais rigorosas.
A leitura serve para se saber como outros pensam e
escrevem, e, sobretudo, saber o que ainda não descobriram. E chega-se ao
melhor, ao principal desafio. Deve-se recolher o essencial das leituras e
transformá-lo em outra coisa.
Apesar da grande diferença entre Schopenhauer e
Sêneca, há entre ambos alguma coisa em comum: não basta somente saber; o que
importa é o que fazer com o conhecimento. Por isso Schopenhauer atacava os
eruditos.
Saber viver, para Sêneca, seria a porta pela qual se
obtém o que fazer com o saber. E aprender a viver, pensava, era aprender a
morrer.
Sobre isso, uma vez, fui contestado por um amigo.
Disse-me que não se aprende a morrer. Ele tem toda a razão: quem vai querer
aprender aquilo que não quer?
Não me recordo o que respondi na ocasião, mas presumo
que pode ter girado em torno do que chamo de expectativa vã: aprende-se a
evitar a morte, porém é inútil.
Conheço pessoas que fazem o diabo para que a morte não
sobrevenha. Sobre isso, há uma frase que diz tudo, inscrita acima da porta de
uma capela portuguesa, em Évora, cujo interior é recoberto de ossos:
Nos ossos que
aqui estamos pelos vossos esperamos.
Conhecedor de todos os pensadores clássicos, Montaigne
deu a melhor receita para se encarar o grande confronto da vida, que é o
morrer.
Remontando aos clássicos, e especificamente a Cícero,
Montaigne considera que a filosofia quer dar respostas a todos os dilemas
humanos, e, por isso, o ato filosófico é uma preparação para a morte. Ele,
desta maneira, realiza o primado de Sêneca: sua leitura, nesse e em outros
casos, serviu para ampliar e aceitar as expectativas em torno de algo tão
desconcertante, que é deixar de respirar e saber que o menos perecível no corpo
são os ossos.
Tanto é que Montaigne acaba dizendo, e o que dizia
praticava, que se não aprendemos a morrer, que isso não seja motivo de tormento
porque a natureza “executará a tarefa”. Sem levar em conta os acidentes
mortais, a própria vida providencia doenças que devemos cultuá-las, cuidando-as
com todas as energias que mesmo no padecimento ainda dispomos, pois uma delas
nos ajudará a morrer.
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